
A Educação Física no Brasil Império
"Chega-se ao Brasil Império e começam a aparecer os primeiros documentos escritos tratando da Educação Física, enfocando principalmente os conceitos de higiene. D. Pedro II, defensor dos exercícios físicos, presidiu diversas conferências na então Escola Normal defendendo o tema. Nesta época a educação era dividida em educação intelectual, moral e física. A Educação Física deste período tem como principal preocupação a melhoria da saúde e da higiene da população, com marcante presença de doutrinas naturalistas, nacionalistas e militares. Conforme citação de NISKIER (1996) “...a medicina mereceu por parte de D. João grande atenção, criando em 1808 na cidade de Salvador o Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia, instalado no Hospital Militar...”
O caminho da Educação Física é definido, seu espaço delineado e seu campo de conhecimento delimitado, ela então se torna um instrumento de ação e de intervenção bastante valioso na realidade educacional e social. A Educação Física surge como um sinônimo da saúde física e mental, é eleita a promotora da saúde, regeneradora da raça, das virtudes e da moral. Os médicos higienistas brasileiros contribuíram em muito para a construção de uma nova política econômica e social, já que o Brasil carecia de um “novo homem”.
Depois que o Governo Real se transferiu da Bahia para o Rio de Janeiro, o ensino militar passou a receber maior atenção. Em 1808, D. João VI cria a Academia da Marinha e 04 de dezembro de 1810, a Academia Real Militar da Corte responsável pela formação do oficialato do Exército Brasileiro e onde deveriam ser ministrados os seguintes cursos: Ciências Matemáticas, Ciência das Observações, Física, Química, Mineralogia, Metalúrgica, História Natural e das Ciências Militares. A Escola passou por várias reformas e modificações e se chamou também Academia Real Militar, Academia Militar da Corte, Escola Militar, Escola Central e Escola Politécnica.
Em 1821 Dom João VI retorna à Portugal deixando D. Pedro como Príncipe Regente. Em 1822 D. Pedro declara a Independência do Brasil e se torna o primeiro Imperador do Brasil com o título de D. Pedro I.
A primeira manifestação de caráter oficial da Educação Física no Brasil foi anotada em 04 de Junho de 1823. Era uma proposta da Comissão de Instrução Pública apresentada pelo Deputado pela província de Minas Gerais o Padre Belchior Pinheiro de Oliveira à Assembléia Geral Constituinte. Como a matéria foi considerada urgente, se transformou em Projeto de Lei, recebeu várias emendas, mas não retornou ao plenário. Em 1828, Joaquim Jerônimo Serpa que compreendia por educação a saúde do corpo e a cultura do espírito lança em Pernambuco a primeira obra especializada em educação física publicada no Brasil, com o título de “Tratado de Educação Física e Moral dos Meninos” tinha como base noções de higiene e puericultura. Outras obras escritas e lançadas em Portugal foram enviadas ao Brasil como o “Tratado de Educação Física e Moral” de Luiz Carlos Munis Barreto, “Tratado de Educação Física dos Meninos” de Francisco Melo Franco e “Tratado de Educação Física” de Francisco José de Almeida.
Antes disso algumas publicações sobre Educação Física foram lançadas em Portugal e trazidas para o Brasil conforme citação de SOEIRO (2003)
“...Tratado de Educação Física e Moral” de Luiz Carlos Muniz Barreto, publicada em 1787; “Tratado de Educação Física dos Meninos” para uso da nação portuguesa, com 12 capitulos, de Francisco Melo Franco, em 1890, “Tratado de Educação Física” de Francisco José de Almeida, em 1891...”.
Em 25 de março de 1824 foi aprovada a Carta Constitucional contemplando a questão do ensino pelo Art 179, nos parágrafos XXXII: “A instrução primária é gratuita a todos os cidadãos” e XXXIII: “A Constituição garante colégios e universidades, onde serão ensinados os elementos das ciências, belas letras e artes”, segundo citação de NISKIER (1996).
A Lei Geral de 15 de outubro de 1827 institui o ensino primário para o sexo feminino e a primeira escola normal construída no Brasil aparece em 1830 em Niterói, nos anos seguintes outras escolas seguem este exemplo como a Bahia, o Pará, Ceará, Paraíba, Rio Grande do Sul, São Paulo, Mato Grosso, e Goiás. Em 1831 D. Pedro I abdica em favor de seu filho D. Pedro II, na época com apenas 8 anos de idade, que só se torna Imperador do Brasil em 1840 quando completou 14 anos de idade.
Ainda em 1832, o deputado Martim Francisco Ribeiro de Andrada, defende na comissão de definição da Assembléia Constituinte um projeto sobre educação da sociedade que recebeu emenda de José Mariano de Albuquerque Cavalcante sugerindo uma premiação para quem apresentasse um plano de Educação física, moral e intelectual (SOEIRO 2003). Segundo AZEVEDO (1996) neste mesmo ano
a Academia da Marinha e a Academia RealMilitar se fundem numa só instituição de engenharia militar, naval e civil com os seguintescursos: A) curso de matemática, de 4 anos; b)curso militar, de 2 anos; c) curso de pontes ecalçadas, de 2 anos; e d) curso de construçãonaval, de 2 anos. Dessa instituição, por sucessivos desmembramentos, é que se destacam,em 1833, em 1858 e em 1874, para constituíremescolas superiores autônomas, três grandesescolas: A Escola Militar, a Escola Naval e aEscola de Engenharia do Rio de Janeiro. Em1833, revoga-se o regulamento de 1832 e desliga-se a Academia Naval da Academia Militar que se mantém com 2 cursos até 1839,quando passa a denominar-se Escola Militar comuma nova organização.”
Em 1837 o Deputado baiano Antonio Ferreira França apresentou à Câmara um Projeto em favor da cultura e da instrução onde indicava a inserção da “ginástica e defesa do corpo” entre outras cadeiras no programa das escolas de primeiras letras.
Em 1845 o Dr Manoel Pereira da Silva Ubatuba apresenta à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro o trabalho “Algumas considerações sobre a Educação Física” demonstrando a necessidade e a importância do moral sobre o físico e vice-versa. Em 1846 Joaquim Pedro de Melo defende a tese “Generalidades acerca da Educação Física dos meninos”. Mas a atividade física somente passa a fazer efetivamente parte dos programas escolares da Corte em 1851 por obra do ex-deputado e então Ministro do Império, Luiz Pedreira do Couto Ferraz com a chamada Reforma Couto Ferraz. Sua regulamentação foi expedida três anos depois e entre as matérias a serem obrigatoriamente ministradas estavam a ginástica no primário e a dança no secundário, mas somente nas escolas da corte.
O Ato Adicional da Reforma Educacional dizia que tanto a educação primária como a secundária ficariam a cargo das províncias e o ensino superior a cargo da administração nacional, portanto cada Província, hoje Estado, adotavam as disciplinas que melhor se adaptavam às necessidades do período. Neste sentido em 1852, Toureiro Aranha, Presidente da Província do Amazonas determina que em seu programa escolar constará a Educação Física, que seria ministrada também, para o grupo feminino, respeitando suas peculiaridades. O Inspetor Geral da Instrução Pública do Município da Corte fazendo uma viagem pelo país, demonstra sua preocupação com a continuidade da prática da ginástica na escola secundária, principalmente pela falta de estrutura das escolas.
Em 1854 a ginástica passa também a fazer parte do programa da escola secundária, realizada no Colégio Pedro II, localizado no Rio de Janeiro, criado em 1739 com o nome de Colégio dos Órfãos de São Pedro. Somente em 1837 por iniciativa do Secretário e Ministro do Império, Bernardo Pereira de Vasconcelos e por ocasião da comemoração dos 12 anos do Imperador é que o Colégio dos Órfãos passa a se chamar Colégio Pedro II.
Em 1860 foi introduzida no Brasil a Ginástica Alemã na Escola Militar, antiga Academia Real Militar da Corte, segundo citação de MELO (2000) “... influenciada principalmente pelo grande número de migrantes alemães que no Brasil continuavam com seus hábitos gímnicos e fundamentalmente da Guarda Imperial, na força militar brasileira que possuía raízes austríacas devido a influência de nossa imperatriz..”.
A Ginástica Alemão utilizava a ginástica aérea de aparelhos, a barra fixa, a barra paralela, o trapézio e as argolas. Isto ocorre particularmente a partir de Friederich Ludwig Jahn que entendia que a prática da ginástica deveria ter características militares com o objetivo de manter o povo forte e saudável, afirmando espírito cívico e patriótico. Reforçando esta influência temos como instrutor de Ginástica na Escola Militar o alemão Pedro Guilhermino Meyer, alferes do estado maior da 2ª classe.
A inserção das atividades físicas no Colégio Pedro II ocorre seguindo o exemplo dos colégios europeus que já utilizavam o discurso dos médicos para justificar a presença dos exercícios ginásticos nas instituições escolares. As aulas eram realizadas em seis dias da semana por 1 hora. O primeiro mestre de “gymnástica” deste colégio foi o Militar, ex-Capitão do Exército Imperial Guilherme Luiz de Taube. Já no final do século XIX começam a surgir as resistências quanto à utilização deste método na sociedade brasileira iniciada pelo Dr. Eduardo Augusto Pereira de Abreu.
Em 1870 a ginástica passou a ser matéria obrigatória em todas as escolas, mesmo tendo sido recebida com muita resistência principalmente no que dizia respeito à sua prática pelas meninas. Em 1876 são criadas no Município da Corte duas Escolas Normais, uma para cada sexo. O objetivo destas escolas era a preparação de professores para a instrução primária, tendo o curso três anos de duração.
No primeiro ano a ginástica era composta de exercícios graduados sem instrumentos, no segundo ano com instrumentos e também princípios gerais de Educação física, intelectual, moral, religiosa e cívica. Já em 1880 as escolas possuíam exercícios disciplinares, movimentos parciais, exercícios ginásticos, equilíbrios, exercícios pírricos, marchas, corridas e saltos.
Mais uma prova da forte presença dos militares no meio civil é a nomeação do Capitão Ataliba M. Fernandes como professor de Ginástica na Escola Normal em 1881.
Segundo citação de SOEIRO (2003)
“... Pelo decreto n.º 330, de 12 de abril de 1890, fica determinado que nas Escolas Militares da capital federal e do Rio Grande do Sul haveria uma sala d’armas, campo de exercícios e linha de tiro, picadeiro, barca e demais aparelhos necessários aos ensino da natação, trem de pontes, ferramentas e utensílios para os trabalhos de guerra.
Em 1886, Pedro Manoel Borges publica um “Manual Teórico-Prático de Ginástica Escolar” destinado às escolas públicas, colégios, liceus, escolas normais e municipais. Segundo MARINHO (1971), Pedro Manoel Borges “... demonstra a necessidade da Educação Física desde o berço e a sua importância para o indivíduo, transcreve uma série de preceitos higiênicos a serem observados na sessões, muitos dos quais ainda tem aplicação hoje. Cogita das noções anatômicas e antropométricas que devem ser ensinadas aos alunos, a partir dos dez anos.”